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O Mercado do Bolhão encerrou para obras no dia 28 de Maio de 2018. Durante os dois anos em que decorrerão as obras, dos 140 comerciantes actuais, 100 irão marcar presença no novo mercado. Desta centena de vendedores, irão migrar para o Mercado Temporário um total de 84 comerciantes. O Mercado Temporário do Bolhão está localizado no Piso -1 do Centro Comercial La Vie e terá as suas portas abertas a partir do dia 2 de Maio de 2018.
Só falta mesmo marcar a sua visita.
HISTÓRIA DO MERCADO DO BOLHÃO
Decorria o início do século XIX quando a Câmara do Porto adquiriu um terreno no centro do Porto, onde viria a ser implementado o actual Mercado do Bolhão. Inicialmente este local não dispunha das melhores características, era na verdade um lameiro, por onde passavam vários cursos de água. Mas foi destas más condições de onde proveio algo que prevalece até aos dias de hoje. Lenda ou não, consta que a abundância de águas resultantes de uma nascente era tal que até formava bolhas de água, grandes bolhas de água, bolhões.
Ainda sem ser conhecido como Mercado do Bolhão, foi neste local onde se começaram a instalar comerciantes e a desenhar os primórdios deste típico mercado. A forte popularidade que alcançou, bem como e necessidade de o Porto ter no centro da cidade um mercado que o abastecesse, impulsionou a sua gradual melhoria, levando a que no início do século XX já existisse um apresentável mercado a céu aberto composto por bancas e ladeado por gradeamento, que era frequentado por todas as classes da sociedade Portuenses.
Foi em 1914 que, segundo o projecto de inspiração neoclássica do arquitecto António Correia da Silva, se iniciou a construção do actual edifício do Mercado do Bolhão. Foi, à data, uma obra pioneira no país e no mundo pois em pleno período de guerra dotou-se a cidade de um admirável espaço comercial que em muito contribuiu para a moral dos habitantes. Afinal, o Porto sempre foi uma capital gastronómica. O Mercado do Bolhão, quer pela sua dimensão, localização ou propósito proporcionou condições únicas (até à data apenas comparáveis com as do Mercado Ferreira Borges) aos vendedores, o que marcou uma nova era em Portugal no que respeita a forma de comercializar produtos alimentares.
HOJE EM DIA
Apesar da degradação física em que o Mercado do Bolhão se encontra, é a perseverança dos comerciantes que faz com que este preserve um caracter próprio e se mantenha fiel ao comércio tradicional. O Mercado do Bolhão, onde ainda mal entraram as balanças digitais e os vendedores são os mesmos há décadas, continua a ser o bastião dos mercados de comida do Porto.
As vendas começam cedo, e se vier da parte da tarde já encontra algumas bancas fechadas e alguns produtos esgotados. Mas aqui vai encontrar de tudo, a oferta é diversa e especializada. E não deixa de encontrar aquele vendedor que gosta de se meter com o freguês que passa, seja ele Português ou não. Os vendedores convivem pacificamente com a grande porção de visitantes que ali está apenas para ver e fotografar. Gente tão simpática que é esta, que chega mesmo a deter a sua passada para não interromper a fotografia alheia.
Quando percorre os sombrios corredores do mercado cedo percebe a devoção dos vendedores aos seus produtos, pela forma como cuidam e organizam o seu espaço.
Nas bancas de hortícolas, são o aroma das frutas da época amadurecidas e as suas cores que o farão parar. Não faltam opções nas verduras, e a estação dita quando veremos hortaliças como grelos, hortos ou penca. Passará também pela banca dos ovos, e das azeitonas mergulhadas em salmoura com tamanhos, cores e sabores para todos os gostos. Não podiam faltar as leguminosas desidratadas, como os tremoços, favas ou feijões secos, armazenados nos sacos de sarapilheira e pesados com as antigas caixas medidoras de madeira, à espera de serem demolhados para as tripas à moda do Porto.
Os talhos e charcutarias são uma parte muito importante do mercado, com são exemplo os Talhos Nº1 e Nº2, a Salsicharia Leandro, a Salsicharia Branquinha ou a Salsicharia da D. Maria Pinto, onde a selecção de carnes frescas prima por todas as partes do animal. É frequente assistir-se ao talhante, de mangas bem arregaçadas, envolvendo numa bacia a mistura que mais tarde acabará nos enchidos dependurados pelos balcões. É um espectáculo digno de audiência, e onde se garante o acervo das tripas enfarinhadas mais frescas a que poderá ter acesso.
Nas peixarias, que muito abundam pelo mercado, as montras são cuidadas como se de verdadeiros aquários se tratassem, e o seu cheiro fresco a mar convida quem passa. Há peixe bom, de olho negro e guelra fresca, por vezes sazonal, como sável e lampreia, sempre fresco e preparado a pedido. As lojas de congelados, que são essencialmente orientadas para os produtos marinhos, fornecem excelentes opções de pescado ultracongelado em alto mar, mas também marisco e outros petiscos congelados.
Já nas padarias, como a da Dona Madalena e a da Dona Rosa Pereira, encontra sensacionais regueifas esculpidas e broas de milho e de Avintes tão frescas e tão apetitosas que se tornam vício. Ainda há a “Senhora das pitas”, que há décadas vende pombos, patos, gansos, e galinhas e pintos de raça Portuguesa e acomoda as suas galinhas nas típicas gaiolas de feira.
Quem prima pelas flores poderá aqui encher o olho, sendo que há vendedores de plantas e flores, que trazem cor e natureza ao mercado. Pode encomendar arranjos ou flores especiais/sazonais por encomenda, como é o caso dos raminhos de violetas.
Mas tudo isto apenas para quem quer fazer compras, já que pelo mercado também encontra locais para almoçar. No piso da entrada, tem o restaurante D. Gina e a Cafetaria Pintaínho, ambos oferecendo uma esplanada repleta de clientela bem disposta e diárias económicas. Se subir um piso, encontra o famoso Nelson dos Leitões, de onde voam deliciosas sandes de Leitão da Bairrada.
Sabemos perfeitamente que a visão dominada por andaimes não é a maior das atracções, mas talvez este estado de lamentável desarranjo tenha ironicamente contribuído para manter a autenticidade do Mercado do Bolhão, erguendo-o como um símbolo da resiliência portuense. Aqui encontra sempre sugestões acertadas para dar uso aos produtos vendidos, e vive-se um ambiente de proximidade com os vendedores e as suas causas. O Mercado do Bolhão está vivo e recomenda-se. Sempre que estiver por perto, entre e compre: encontrará tudo o que precisa. Apoie o comércio local e tradicional, vai ver que vai gostar.
O FUTURO DO MERCADO DO BOLHÃO
A requalificação do Mercado do Bolhão vai mesmo acontecer. A postura da Câmara face ao destino do mercado tem sofrido muitas reviravoltas, e enquanto a intenção de demolir o edifício parece ter sido afastada, há ainda decisões pouco claras quanto ao futuro dos vendedores e do mercado tal como o conhecemos. As obras deverão iniciar-se neste ano de 2016, com um projecto de reabilitação de técnicos da Câmara do Porto e uma equipa coordenada pelo Arquitecto Nuno Valentim, com um orçamento um pouco superior a 20 milhões de euros.
Numa cidade onde o centro histórico é classificado como Património Cultural da Humanidade pela UNESCO, não atender ao máximo à preservação de características arquitectónicas centenárias do Mercado do Bolhão será algo que deixará uma marca permanente nas gerações futuras que terão que crescer cada vez com menos do Porto à sua volta. É triste que o projecto de requalificação contemple a demolição das típicas barracas do Bolhão, desenhadas pelo Arquitecto José Teixeira Lopes, e possivelmente não contemplará também a preservação de outros traços originais do Mercado.
O que está realmente em causa? Não se sabe quais serão so efeitos a longo prazo do realojamento temporário dos vendedores no Piso – 1 do Centro Comercial La Vie Porto Baixa (Rua Fernandes Tomás, 506), é certo que os vendedores terão melhores condições de trabalho, mas também estarão mais escondidos dos fregueses. Por um lado, é de louvar a aparente preocupação na continuidade dos antigos vendedores, numa tentativa de se evitar a total conversão de um mercado de frescos numa praça de alimentação de centro comercial. Receita essa que foi aplicada sem pudor noutros mercados da cidade, e que a longo prazo destrói a frágil simbiose entre produtores locais e compradores no centro da cidade. Por outro lado, fecharam-se os olhos à enorme perda de património arquitectónico, nomeadamente na destruição das típicas barracas do Bolhão. Será uma lamentável perda de exemplares únicos, que num misto de materiais reúnem motivos orientais e neogóticos. Sobra apenas a memória dos que lá foram, e a imaginação dos que estarão para vir.
FONTES: ARQUIVO MUNICIPAL DO PORTO