Chegámos à época natalícia, tempo de comemoração e tradições, em que muita atenção se dá à mesa. Enquanto que na maioria das casas as pessoas se atiram de corpo e alma aos múltiplos afazeres culinários, há algo que concordam procurar fora. É ele o bolo-rei, que dá cor a todas as mesas Portuguesas, e que o costume dita que seja encomendado e levantado nas confeitarias de confiança.
Isto porque é uma iguaria ainda altamente sazonal, que desperta o espírito competitivo das confeitarias, que empregam as melhores técnicas e ingredientes para que conquistar a exigente clientela. Não é segredo que um bolo-rei excelente rapidamente conquista fama e prestígio à casa que o faz.
Sabe então quais são as confeitarias tradicionais do Porto onde o bolo-rei dá cartas? Pelo caminho, aproveite para conhecer um pouco da história deste bolo tão simbólico que chegou a ver a sua existência e nome em risco.
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A HISTÓRIA DO BOLO-REI
A história do bolo-rei em Portugal não é tão longa quanto o que se possa pensar, ainda assim terá quase 150 anos. É consensual que a receita que conhecemos seja de origem francesa, proveniente do gâteau des rois de Bordéus, que é bastante diferente da também deliciosa galette des rois, de massa folhada.
A receita do bolo-rei terá chegado a Portugal em 1875 pela mão de Baltasar Rodrigues Castanheiro Júnior, proprietário da Confeitaria Nacional em Lisboa, depois de uma viagem a Paris. Terá recrutado um confeiteiro parisiense, Gregório, e lançado o bolo-rei no Dia de Reis. Tornou-se um sucesso esmagador, e rapidamente a receita se propagou a outras confeitarias lisboetas. Chegou ao Porto em 1890 pela Confeitaria Cascais, por receita obtida pelo dono também em Paris.
Tradicionalmente, come-se o bolo-rei no dia 6 de Janeiro, na celebração da Epifania, ou seja, o dia em que os reis magos chegaram a Belém. Porém, o consumo do bolo-rei não tardou a associar-se também ao Natal, como ainda hoje é popular.
Curiosamente, a existência — ou pelo menos o nome — do bolo-rei esteve tremida com a implantação da República em 1910, à semelhança do que aconteceu em França durante a Revolução Francesa. Mudou-se temporariamente o nome (bolo Presidente, bolo Nacional ou bolo Arriaga), e manteve-se o costume de o saborear.
A TRADIÇÃO DA FAVA
A introdução da fava no bolo-rei (e talvez o próprio bolo, segundo alguns historiadores) procede possivelmente do ritual romano das festas de Saturnália, onde se escondia a fava num bolo e o feliz contemplado seria coroado rei por um dia. O costume continua a aparecer pela história, acabando por ser ser associado à celebração da Epifania durante a Idade Média, e o facto é que ainda hoje se pratica, se bem que o significado de “apanhar a fava” possa diferir entre culturas. Por cá, a pessoa que tem a sorte de apanhar a fava é aquela que tem o azar de comprar o bolo-rei no próximo ano. Ainda assim, hoje em dia é cada vez mais difícil encontrar a fava no bolo, mas com sorte ainda nos sai um brinde de porcelana.
OS INGREDIENTES (E A RECEITA) DO BOLO-REI
Os ingredientes da receita do bolo-rei tradicional são simples: massa brioche (manteiga, farinha, açúcar, ovos, sal, fermento), raspas de citrinos, frutas cristalizadas (cidrão, abóbora, cereja, laranja e figo), pinhão, nozes, amêndoas, sultanas e bebidas espirituosas como a aguardente. É depois decorado a rigor com grandes fatias de frutos cristalizados, nozes e açúcar em pó. Para quem o quer fazer em casa, recomenda-se uma visita às maravilhosas mercearias finas tradicionais, que têm sempre por esta altura uma selecção dos melhores frutos cristalizados.
São também muito populares as variantes do bolo-rei, como por exemplo o bolo-rei escangalhado ou o bolo-rainha. O bolo-rei escangalhado já se conhece pelo menos desde 1939 (Confeitaria Dantas de Viana do Castelo), e é composto por frutos secos e doce de chila, fabricando-se um pouco por todo o país. O bolo-rainha é o consorte ideal para quem torce o nariz aos frutos cristalizados, sendo recheado apenas por frutos secos. Claro que agora existem coisas mais extravagantes, como bolo-rei com chocolate, mas isso fica para outra altura.
Para quem quer meter as mãos na massa, temos aqui um vídeo do fantástico Chef Mário Rolando que ensina a fazer uma receita de bolo-rei tradicional. Segue abaixo a lista dos ingredientes e respectivas quantidades.
Receita de bolo-rei tradicional do Chef Mário Rolando
1 kg de farinha tipo 55
500 g de fruta macerada
200 g de frutos secos
200 g de açúcar
200 g de manteiga
200 ml de leite
4 ovos
100 ml de bebidas alcoólicas
22 g de fermento
20 g de sal
Fruta cristalizada para decorar
Opcional: massa-mãe
ONDE COMPRAR BOLO-REI NO PORTO?
A verdade é que comprar o bolo-rei na confeitaria às portas da véspera de Natal exige uma força de vontade que quase só os fãs incondicionais e os tradicionalistas conseguem arranjar, porque digo-vos uma coisa: ficar na fila com um frio de rachar não é para todos. Pelo menos enquanto não aparece uma app que nos entrega o bolo-rei em casa. Por outro lado, a cumplicidade que se forma na fila do bolo-rei é eterna. Vale a persistência para se colher os louros: quando se corta a primeira fatia é que se vê a diferença. Não há volta a dar.
Seja de que maneira for que o bolo chega à mesa, a verdade é que ele tem de vir de algum lado. E no Porto, como cidade gastrónoma que é, o bolo-rei quer-se excelente. Felizmente temos a sorte ou o mérito de ter tantas boas confeitarias, que sabem bem que a idade não é posto, e por isso se esmeram ano após ano para produzir o melhor. Surge o debate: quem é que faz o melhor bolo-rei?
Para nos metermos ao barulho, seleccionamos os que são para nós os melhores bolos-rei do Porto, e onde comprá-los:
Dica: Se quiser provar bolo-rei e especialidades da doçaria Portuguesa, bem como aprender tudo sobre elas no processo, então junte-se a nós numa das nossas tours gastronómicas.
OS MELHORES BOLOS-REI DO PORTO
PETÚLIA
É inegável que esta casa de chá e confeitaria traz as melhores memórias das quadras festivas à maioria dos Portuenses desde a sua fundação em 1972. Felizmente, o bolo-rei da Petúlia transcende o Natal: está disponível todo o ano. Mas é no Natal que as filas dão a volta ao quarteirão, e o cheiro a brioche e fruta cristalizada caramelizada invade o imaginário de todos os que passem pela Rua Júlio Dinis. Para quem não é fã de frutos cristalizados, o bolo-rainha é feito exclusivamente com frutos secos, e é igualmente bom.Quem não quer desesperar na fila pode dar um salto à Duvália, que pertence aos mesmos donos e produz a mesma receita de bolo-rei.
Preço: 17 €/kg
Rua de Júlio Dinis, 775
+351 226 066 181
Seg—Dom: 8—23h
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PORTO RICO
A discreta pastelaria Porto Rico é um segredo bem-guardado de quem vive ou frequenta o quarteirão. Situada no belíssimo edifício Parnaso do arquitecto José Carlos Loureiro, a fachada amarelada esconde uma pastelaria que labora desde 1958. O bolo-rei é uma especialidade sazonal da casa, feito diariamente com o maior dos cuidados. A massa brioche caseira tem um sabor muito característico, e quem conhece sabe que o bolo é muito bem recheado de frutos secos e cristalizados. É um bolo-rei bem tostado, macio e generoso. Para além do bolo-rei, vale a pena perder a cabeça com os jesuítas, os suspiros, e os famosos digestivos. Aproximando-se o Natal, convém ligar e reservar o bolo-rei, sob pena de o ver esgotado. Já agora, ao espreitar para o jardim do prédio vão encontrar um colorido banco do pintor Júlio Resende.
Preço: 13 €/kg
Rua de Oliveira Monteiro, 497
+351 226 002 221
Ter—Dom: 7:30—21h
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CONFEITARIA NANDINHA
Aberta desde 1975, a Confeitaria Nandinha é conhecida pela sua fabulosa glorinha, mas tem também uma forte tradição no bolo-rei. Ou não se formasse lá uma respeitosa fila que se assenhora de alguns milhares de bolos-rei na véspera de Natal. Durante a quadra, há bolo-rei todos os dias. Fora dela, há sempre ao fim-de-semana, ou então por encomenda. Prove também o bolo-rei escangalhado e de frutos secos. Não se esqueça de levar uns húngaros para o caminho!
Preço: 14 €/kg
Rua de Serpa Pinto, 74
+351 228 319 402
Seg—Dom: 7—21h
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NOVA REAL
Do Carvalhido surge-nos o crescentemente afamado bolo-rei da Nova Real. Composto por uma quantidade imensamente generosa de frutos secos e cristalizados, na quadra o bolo-rei vai ao forno todos os dias. Como há sempre alguém na família que prefere um bolo-rei alternativo, aqui têm-no também de chila, de frutos secos, ou de chocolate. Salienta-se também o cobiçado pão-de-ló húmido, os queques de pêra e noz, e outros bolos de Natal por encomenda (lampreia de ovos, tronco de Natal).
Preço: 15 €/kg
Rua da Prelada, 132
+351 228 303 935
Seg—Dom: 07—20:30h
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CONFEITARIA CUNHA
O imaginário de Natal da Baixa do Porto estaria incompleto sem o icónico bolo-rei da Confeitaria Cunha. Aberta desde 1906, esta confeitaria prima pela excelência dos seus doces, com particular destaque para o pão-de-ló, os bombons e claro, o bolo-rei. Durante a quadra, a confeitaria entra numa azáfama de fornadas para poder abastecer as habituais longas filas de clientes. E como na Cunha levam a sazonalidade a sério, fora de época só pode deliciar-se com o bolo-rei por encomenda.
Preço: 14 €/kg
Rua de Sá da Bandeira, 676
+351 223 393 070
Seg—Dom: 12—2h
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